No rasto do sol

quinta-feira, novembro 10, 2005

A resposta ao (do) Manel

Não sei se por culpa dos romances (também dos light =)) que gosto de ler, se por causa das comédias românticas que não me canso de ver (tantas vezes, pela noite dentro enrolada numa manta, sozinha no sofá da sala em dias frios como o de hoje), se pela vida... ou se por tudo isto misturado (esta estranha alquimia de que também eu sou feita), a verdade é que acredito mesmo em finais felizes daqueles em que duas pessoas que foram feitas uma para a outra se encontram e se amam, e ficam mesmo juntas na vida e para a vida. É óbvio que há momentos em que esta crença é posta em causa, por cepticismo e pragmatismo, também por ignorância. "Só compreendemos verdadeiramente o que vemos espelhado no coração". Certo é que quero acreditar que é assim, e vou acreditando, porque querer é poder.
Ainda não vivi tempo suficiente para ter propriedade sobre o 'para sempre' e isso é bom... Pegando nas tuas palavras, posso ter "saudades do futuro"... a aguarela que decidi pintar com as cores que a vida me vai concedendo e emprestando. Por enquanto, 'para sempre é só enquanto dura'.
Já tive a sorte de gostar muito de pessoas incríveis, seres humanos extraordinários que me deram motivos de sobra para amar dando folga à razão, sem precisar de razões. Por esta ou aquela razão, não ficaram comigo ou não ficámos juntos... acredito que, simplesmente, não me estavam destinados. Não obstante, foram peças basilares na minha formação e faz todo o sentido que tenham cruzado o meu caminho. Para além de tudo o que aprendi com eles, fizeram (ou ajudaram a fazer) de mim o que hoje sou... metaforicamente falando, é como se cada um representasse uma pedrinha do trilho que é necessário percorrer para chegar à casinha do chocolate. E, é por isso que acredito que as lágrimas que chorei, as desilusões, os desgostos (e, claro!, a parte boa)... nada disso foi em vão, faz tudo parte de um inevitável processo de crescimento e amadurecimento, da construção do tal eu, para me tornar na pessoa certa da vida do alguém que anda por aí algures à minha procura.
E acho que é assim com toda a gente.
Não sei se só se ama uma vez na vida, ainda tenho que descobrir; mas, tenho a certeza que se pode gostar muito e mais do que uma vez, porque o amor é sempre diferente... como uma viagem na montanha russa ou uma volta no carrossel. As histórias são diferentes, como as pessoas, não são melhores ou piores... embora possam fazer de nós pessoas melhores, se estivermos predispostos a isso. Mais uma das minha verdades, que acaba de tropeçar em mim (ou eu nela) através desta linhas e que passa a ter nome... acho que o que tenho procurado fazer é aproveitar o amor para ser um ser humano mais feliz e melhor. Por isso é que acredito que vale sempre a pena, nem que seja só por isso. Como diria a minha amiga Rita, "Amar é demais"!
E assim se explica o porquê de a amizade ser a mais sublime forma de amor. Como na história, somos todos Marias e Joões que seguem o trilho das pedrinhas, até chegar à casinha de chocolate, de mãos dadas. Os amigos são isso mesmo, os companheiros que escolhemos para estarem ao nosso lado na caminhada e fazerem o percurso connosco.
Se na essência as pessoas nunca mudam, deve ser por isso que eu sou metade-mulher metade-menina, acredito em homens (que não sendo príncipes encantados, gostam de nós como se fossem) responsáveis por finais felizes e escrevo contos de fadas para gente crescida.
Tento fugir aos clichés e frases feitas mas cabo por concluir, após esta reflexão em voz alta, que 'encontrar a pessoa certa depende de ser a pessoa certa' e que, com ou sem Happy End, há sempre amor... há sempre (um?!) amor destinado (predestinado?!) a cada um de nós e a altura de o viver há-de chegar no tempo certo dos nossos afectos porque, como diz a minha mãe, aquilo que tiver que ser nosso às nossas mãos virá parar.
Seja como for, continuo a crer que o que importa mesmo é o aqui e agora, a intensidade com que se vive e a paixão com que se vive tudo aquilo que nos é dado a viver (se calhar, um dia acerta-se mesmo!). Tudo o resto são interrogações, enormes ? que ajudam a alimentar o medo que nos faz criar e vibrar.
Somos produto das emoções, as nossas e as dos outros (também das que os outros despertam em nós)... as dos livros, dos filmes, da vida... e seja lá de que maneira for, é através delas que sonhamos e crescemos. Tomar o sonho pela vida e a vida pelo sonho é o fado dos românticos incorrigíveis que tentam aprender a viver vivendo.
Metade-menina, metade-mulher... numa balança (de afectos) razão e coração... descubro que sou toda feita de coração e que, por isso mesmo, preciso inegavelmente da razão... até para viver e ter saudades de um futuro cheio de contos de fadas para meninos e meninas já crescidos. Por agora, uso a razão do coração para andar de mão dada com os Joões e as Marias a contar pedrinhas e a pintar a tela do presente com o arco-íris de cores que já conheço, enquanto vou aprendendo a escrever e a crescer... sem nunca deixar de ser menina, (nem que seja) só para poder acreditar.
*

Obrigada Manel.
Um beijinho grande,
Tia Inês.

quinta-feira, novembro 03, 2005

Lugar do coração

Para o Manel, o post prometido.
Chegou o Inverno...
Há vários dias que chove incessantemente, o sol foi embora e a luz mágica desta cidade esconde-se por trás das nuvens. Esta Lisboa que eu amo, cinzenta e sombria, rendida e apagada. Deve ser da saudade, por causa dela, por causa de ti que a vejo assim. Será que nessa terra que te acolhe também chove assim? E terá a chuva o mesmo cheiro?
Quando me envolvi contigo sabia, à partida, que um dia acabarias por me deixar; não por falta de amor mas, por esse ímpeto de conhecer novos mundos, essa sede de viver que nunca te permitiu criar amarras. Apaixonei-me por ti, por isso e apesar disso... mesmo sabendo que ficaria cativo e que a dor infligida pela tua ausência seria uma inevitabilidade.
Escolhi viver esta estória, sem promessas ou juras de amor eterno. Agarrei o instante e entreguei-me a cada momento como se não houvesse amanhã. Durante meses escrevemos um diário de partilha, o relato sublime de uma paixão maior que me fez andar um palmo acima do chão. Pela primeira vez.
Eu sei que não é suposto os homens dizerem estas coisas, mas a verdade é que te amei realmente e de forma arrebatada. Pelo teu cheiro, pela tua contagiante gargalhada, pelo teu enorme cabelo sempre desalinhado, por esses olhos cor de mel, por tudo e mais alguma coisa.
Apaixonei-me por ti como nunca me havia apaixonado por coisa alguma nesta vida. Como um drogado, senti a angústia da ressaca do teu amor. Que vida é esta que te trouxe, me deixou encantar, para depois te tirar de mim levando-te para tão longe? Não é justo, pois não?
És um ser único, dotado de asas, precisas de ser livre para ser feliz, não tinha o direito de te deter; até porque é assim que gosto de ti, gosto mesmo de ti assim. Não és uma mulher convencional, daquelas que sonham casar e ter filhos... o teu horizonte expande-se muito para além de um quotidiano dito ‘normal’. A tua missão na Terra é deambular, viajar por dentro e por fora, aceitar novos e cada vez mais audazes desafios... e isso não inclui outra pessoa, não me inclui a mim. Eu que ambiciono coisas tão simples, tão mais terrenas... o meu apartamento no último andar com vista privilegiada sobre a cidade que escolhi para viver, um carro desportivo, o sossego do monte na costa alentejana, o bulício da noite lisboeta onde te conheci e as viagens pontuais que me ofereço de presente para poder conhecer outras paragens e ter sempre o grato prazer de voltar com a certeza de que é aqui que pertenço.
Por amor, por ti, teria largado tudo... mas quanto tempo duraria? Eu não sou um ‘saltimbanco louco’, quando a febre da paixão esmorecesse acabaria por sentir falta da segurança de uma vida certa, com casa, carro, carreira e contas para pagar. Não se pode viver só de amor e eu não nasci dotado do teu instinto gregário, muito menos, de alma de viajante.
Sou um financeiro, minha querida. Fui treinado para ser um homem racional, frio e calculista. Estaria a negar a minha natureza se me armasse em adolescente inconsequente e abandonasse a vida que construi para ir atrás de ti. Cada um tem que perseguir os seus próprios sonhos e o teu é bem diferente do meu. Só sentes o apelo da partida porque eu não sou suficientemente importante para que não te restasse outra alternativa que não ficar. Vais perceber isso se um dia aparecer alguém que te vire a cabeça e te faça querer ficar e permanecer por tempo indeterminado.
Não me cabia a mim pedir-te que não me deixasses, até porque se o fizesse estaria a incorrer num erro tremendo... estaria a reclamar uma coisa que não se cobra: amor. E depois, se um dia corresse mal, atirar-me-ias em cara que havias desistido de tudo por mim. Não era razoável.
Vivi, então, esta paixão até ao fim.
Dizem que os amores de verão se enterram na areia... este custa tanto a enterrar. Talvez por ter sido o maior, o melhor, o mais intenso, o primeiro, o meu amor. Aquele que gostaria de ter vivido, aquele em que queria ter podido investir o melhor de mim por uma vida inteira. Esta foi a única vez em que me imaginei a casar e ter filhos... sabes quando tens a nítida sensação de que encontraste a pessoa certa?!
Só hoje fui capaz de fazer o balanço de tudo isto. Entrei no carro e deambulei por Lisboa, ausente de mim, mergulhei num processo analítico de introspecção para poder ter a faculdade de extravasar. Imbuído no espírito do dilúvio, varri recordações, fiz a retrospectiva e arrumei as ideias.
Parei no miradouro da Graça, contemplei a cidade do alto e tive a certeza de que, apesar de te amar apaixonadamente, é aqui que pertenço. Não poderia nunca viver noutro lado, num sítio onde a chuva não tivesse este cheiro e as lágrimas este sabor a sal a que chamamos saudade. Sou daqui, este é o meu mundo e o meu reino, não o posso abandonar. Só me resta ficar e permanecer à espera que um dia queiras voltar para assentar arraiais, porque se até mesmo os pássaros precisam de ninho, como os barcos de porto onde atracar, tu também hás-de precisar de um abrigo para onde voltar.
Lisboa é um lugar mágico onde a saudade também sabe a sol, porque há sempre uns braços estendidos para abraçar quem chega.